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Não assistir BBB não te faz mais inteligente, descolado ou superior - por Marina Mentz

A primeira coisa a ser dita sobre o reality show Big Brother Brasil, veiculado pela Rede Globo, é: este não é um texto para te convencer a ver o programa - até porque ele não precisa disso, ele se divulga sozinho. A segunda coisa, bem importante, aliás, é que não assistir este programa não faz ninguém ser mais inteligente, mais cool ou mais evoluído, e eu vou aqui argumentar brevemente o porquê.


Como acontece em todas as edições do programa, no ar desde 2002, as redes sociais são inundadas da polaridade entre quem acompanha e quem não acompanha o reality ao início da temporada. Nesta semana, não foi diferente. Quem assiste, defende com unhas e dentes. Quem não, brada superioridade e que "não ganha nada com isso". E é possível entender os dois pontos, basta substituir por alguma outra paixão que movimente muito dinheiro no País - pode ser o mercado de futebol, pode ser o ramo de maquiagem, por exemplo. Em comum, as práticas ajudam a compor culturalmente o social e o indivíduo, e o BBB é uma amostra evidente disso, pois se retroalimenta do comportamento humano daqueles confinados no programa e dos que acompanham e não acompanham o show, ou seja, a audiência.


Embora tenha o nome inspirado na obra de George Orwell, o reality, muitas vezes, soa como sinônimo de "baixa cultura", conceito que inexiste nos estudos culturais, inclusive. Mas esta ideia de que BBB não serve pra nada vem muito de uma superioridade equivocada, pois ali no programa se vê festas com bebedeira, roupas de banho e muitos corpos à mostra, gente que fala com conjugações e tempos verbais equivocados. O fato é que a vida real, a nossa vida, está cheia disso também - a diferença é que não há câmeras 24 horas mostrando tudo em todo lugar. Mas eu entendo quem questiona a necessidade disso tudo ser exibido assim, na gigante janela da televisão brasileira.


Faço coro no questionamento e somo ao pacote novelas, programas de auditório e outros produtos feitos por nós, comunicadores, que têm conteúdos questionáveis também. Nosso desafio constante está aí: comunicar com responsabilidade e sabedoria. Por isso argumento que o programa debatido aqui não deve ser descartado sob argumento de inválido. Ele pode nos ajudar a qualificar estratégias de veiculação e conteúdo de comunicação.


E digo de novo, não quero te convencer a assistir ou divulgar o programa, a Globo não precisa disso: remodelou o funcionamento do show nos últimos anos, aproveitou a influência dos influencers para se reerguer, veicula no streaming, capitaliza com patrocinadores cada minuto e cada prova do programa. Este texto é apenas para dizer que ali, naquele aquário humano, é possível compreender lógicas de relacionamento, antecipar tendências de consumo da nossa área, a comunicação, e até acessar debates sociais distantes da grande mídia, como as questões raciais, de gênero, de classe e regionalismos - afinal, não é novidade pra ninguém que a comunicação de massa tem sido uma grande ferramenta para cristalizar estereótipos desde muito tempo, então o que é apresentado no programa soa como uma amostra um pouco mais realista de representatividades.


Claro que não dá pra esperar de um programa de entretenimento muito mais do que isso, e está tudo bem. Esta é a proposta do programa. Mas também não se pode reduzir a megaprodução ao besteirol, pois, se observado com sabedoria, o show pode despertar valiosas reflexões para o mercado da comunicação.


Marina Mentz é jornalista e pesquisadora da Comunicação.



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