Os primeiros imigrantes ou seus descendentes, só tiveram chance de chegar a cargos políticos a partir de 1881, com a promulgação da Lei Saraiva. Karl von Kahlden, Karl von Koseritz, Frederico Bartholomay, Wilhelm ter Brüggen e Frederico Haensel, apenas alcançaram o cargo de deputado provincial após a promulgação da Lei Saraiva, em janeiro de 1881. Até então, a legislação eleitoral limitava o acesso de estrangeiros, mesmo os naturalizados, aos cargos públicos eletivos de maior monta, isto é, de deputados provinciais e gerais, e senadores do império. Essa restrição foi instituída na Constituição de 1824 e assim permaneceu ao longo de mais de cinquenta anos.
Em seu capítulo VI, a dita Carta Magna versava sobre as eleições para deputados, senadores, e membros dos conselhos gerais das províncias. Eram caracterizadas como indiretas, em que os cidadãos ativos, autorizados a votar, escolheriam em um primeiro momento, nas assembleias paroquiais, os eleitores de província, que por sua vez, iriam escolher os representantes provinciais e gerais. Ficava estabelecido no Art. 91 que poderiam votar nas eleições primárias “Os Cidadãos Brasileiros, que estão no gozo de seus direitos políticos” e “Os Estrangeiros naturalizados”, portanto, havia a possibilidade de certa participação política aos imigrantes já nos princípios do período imperial e do processo de colonização europeia no Rio Grande do Sul. Além disso, o Art. 94, ao estabelecer quem poderiam ser os Eleitores que escolheriam os deputados, senadores, e membros dos conselhos de província, excluía apenas os que não tivessem renda liquida anual de duzentos mil réis em bens de raiz, indústria, comércio ou emprego, os Libertos e os criminosos pronunciados em querela, ou devassa, permitindo, assim, aos estrangeiros naturalizados a possibilidade de serem Eleitores. Porém, o Art. 95 definia aqueles que, apesar de poderem ser Eleitores, não eram aptos a serem nomeados deputados: “I. Os que não tiverem quatrocentos mil réis de renda liquida, na forma dos Arts. 92 e 94; II. Os Estrangeiros naturalizados; III. Os que não professarem a Religião do Estado”. Ficavam excluídos, dessa forma, os imigrantes alemães, mesmo os naturalizados (BRASIL, 1824).
Pouco mudou com a Lei nº 387, de 19 de agosto 1846, que regulamentou como deveriam proceder as eleições de senadores, deputados, membros das assembleias provinciais, juízes de paz, e das câmaras municipais do império do Brasil. Em seu Art. 17, mantinha entre os votantes os estrangeiros naturalizados, contanto que tivessem pelo menos um mês de residência em sua Paróquia antes da formação da Junta Eleitoral. O Art. 53 mantinha os estrangeiros naturalizados aptos a serem escolhidos Eleitores. Entretanto, novamente ficava determinado que estes não poderiam ser deputados, bem como todos cuja renda liquida anual, avaliada em prata, fosse inferior a quatrocentos mil réis, e os que não professassem a Religião do Estado. O Art. 75 era bem específico quanto a isso, excluindo os estrangeiros “ainda que naturalizados sejam” (BRASIL, 1846). Estes, pelo menos, poderiam ser votados para Juiz de Paz e tentar uma cadeira nas câmaras municipais,
Art. 97. Podem votar para Juízes de Paz, e Vereadores, todos os cidadãos compreendidos na qualificação geral da Paroquia.
Art. 98. Podem ser Vereadores todos os que podem votar nas Assembleias Paroquiais, tendo dois anos de domicilio dentro do Termo.
Art. 99. Podem ser Juízes de Paz todos os que podem ser Eleitores, com tanto que morem no distrito, a que pertencer a eleição (BRASIL, 1846).
Portanto, apesar das restrições de renda e da obrigatoriedade da naturalização, os estrangeiros poderiam tentar cargos eletivos em seus municípios, atuando na política institucional local. Essa característica se manteve até 1881, mesmo após várias modificações da legislação eleitoral realizadas através de uma série de decretos1. Exemplo disso temos na colônia Santo Ângelo, estabelecida às margens do Rio Jacuí em 1857, onde Pedro Müller Júnior foi eleito vereador para a câmara municipal de Cachoeira do Sul em 1872, para o período de 1873 a 1875, e chegou a exercer o cargo de presidente da câmara2. Por sua vez, o Barão von Kahlden já havia sido eleito como vereador suplente de Cachoeira do Sul em 1853.
Como salienta Adonis Valdir Fauth4 (2005), autor de diversos livros sobre a presença suíça no Rio Grande do Sul, o processo de naturalização dos imigrantes alemães foi lento e tortuoso até o final do século XIX. A cidadania plena, em parte considerável dos casos, foi obtida somente na República, quando ficou reconhecido, através do Decreto nº 58-A, de 14 de dezembro de 1889, firmado pelo governo provisório da república, que “Os estrangeiros naturalizados [...] gozarão de todos os direitos civis e políticos dos cidadãos natos, podendo desempenhar todos os cargos públicos, exceto o de Chefe do Estado” 5. Todos os estrangeiros com residência no Brasil por pelo menos dois anos desde a data do citado decreto, passaram a ser considerados brasileiros. Esse dispositivo legal beneficiou todos os imigrantes, independentemente da sua origem, e se caracterizou como uma inversão de exigências, afinal, o estrangeiro que não quisesse ser brasileiro teria de manifestar não querer a cidadania brasileira mediante termo assinado em sua municipalidade, o inverso da situação vivida durante o período imperial (FAUTH, 2005).
A naturalização, portanto, consolidou-se por decreto, enquanto uma política republicana, dispensando os pedidos e interesses individuais. Todos passaram a ser brasileiros. Antes desse momento, porém, não foram poucas as situações em que colonos ficaram sem obter a cidadania, obstaculizada em maior grau ao colono que não professava a religião do Estado. Os entraves e dificuldades encontrados pelos colonos a fim de obter sua naturalização podem ser exemplificados a partir das disposições da Lei de 23 de outubro de 1832 (BRASIL, 1832), que tratava sobre a naturalização de estrangeiros. O governo regencial ficava autorizado a ceder a carta de naturalização a todo o estrangeiro que pudesse comprovar ser maior de vinte e um anos de idade; achar-se no gozo dos direitos civis como cidadão do país ao qual pertencia, salvo se os tivesse perdido por motivos políticos; declarar na câmara do município de sua residência seus princípios religiosos, sua pátria, e a pretensão de fixar seu domicilio no Brasil (a Lei especifica alguns grupos que assim o deveriam fazer, não estando todos os imigrantes obrigados a fazê-lo); ter residido no Brasil por pelo menos quatro anos consecutivos; e possuir bens de raiz no Brasil, ou nele ter parte em fundos de algum estabelecimento industrial, ou exercer alguma profissão útil, ou viver honestamente do seu trabalho.
Para obter a carta de naturalização, era imprescindível provar por documentos as exigências da lei, como as declarações, certidões, ou atestados passados pelos agentes diplomáticos, ou consulares da nação da qual provinham, considerados provas suficientes. O imigrante deveria procurar o juiz de paz da freguesia na qual morava para dar início ao processo, apresentando toda a documentação exigida. Obtida a sentença positiva, o próximo passo seria requerer a sua naturalização ao governo, pelo intermédio do presidente da respectiva província, ou diretamente, dirigindo-se ao ministro do império (BRASIL, 1832). Portanto, todas essas etapas e exigências tornavam a busca pela naturalização um processo oneroso e demorado, possível a poucos imigrantes. Essa situação limitava a atuação de estrangeiros na política.
Fonte: IMIGRAÇÃO ALEMÃ E POLÍTICA de Carlos Eduardo Piassini, com o apoio da Assemble Legislativa do Rio Grande do Sul/Pesquisa de Bado Jacoby
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