O presidente Jair Bolsonaro (sem partido) voltou seu discurso na 76ª Assembleia-Geral da ONU (Organização das Nações Unidas), em Nova York, hoje, a investidores internacionais e ao público interno bolsonarista.
Em cerca de 12 minutos, ele chamou a imprensa de "mentirosa", passou informações falsas sobre o combate ao desmatamento na Amazônia pelo seu governo e insistiu em práticas erradas na pandemia, como desincentivo ao lockdown e apoio ao tratamento precoce.
"Venho aqui mostrar o Brasil diferente daquilo publicado em jornais ou visto em televisões. O Brasil mudou, e muito, depois que assumimos o governo em janeiro de 2019. Estamos há 2 anos e 8 meses sem qualquer caso concreto de corrupção", começou o presidente, primeiro chefe de Estado a falar, como manda a tradição. Ele ignorou investigações como as da CPI da Covid, que apura denúncias de corrupção na compra de vacinas contra a covid-19.
De cara, ele voltou seu discurso ao investimento internacional. Além de desconsiderar as denúncias que envolvem casos de corrupção do seu governo na CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) da Covid, ele procurou passar uma imagem positiva da situação financeira do país.
"Até aqui, foram contratados US$ 100 bilhões de novos investimentos e arrecadados US$ 23 bilhões em outorgas. Na área de infraestrutura, leiloamos, para a iniciativa privada, 34 aeroportos e 29 terminais portuários", afirmou o presidente.
Ao falar de um "novo Brasil", com a "credibilidade recuperada", ele também se voltou aos apoiadores internos, que lotavam a caixa de comentários do canal oficial da ONU no YouTube.
"O Brasil tem um presidente que acredita em Deus, respeita a Constituição e seus militares, valoriza a família e deve lealdade a seu povo", disse Bolsonaro, que considera este ponto "uma base sólida" para um país que estava "à beira do socialismo" —embora o Brasil nunca tenha passado por isso.
Erros da pandemia
Bolsonaro insistiu ainda sobre erros no combate à pandemia. A outros chefes de Estado, ele voltou a criticar o lockdown, medida já comprovada pela ciência, e a defender o tratamento precoce, uma solução oposta, não recomendada internacionalmente.
Segundo Bolsonaro, "as medidas de isolamento e lockdown deixaram um legado de inflação, em especial, nos gêneros alimentícios no mundo todo". Não há comprovação que isso tenha acontecido.
O que há comprovação é que as medidas de isolamento social funcionaram em todos os lugares que a implementaram corretamente e ajudaram a diminuir o ritmo de casos e aumentar mortes.
"Desde o início da pandemia, apoiamos a autonomia do médico na busca do tratamento precoce, seguindo recomendação do nosso Conselho Federal de Medicina. Eu mesmo fui um desses que fez tratamento inicial", declarou Bolsonaro.
O chamado tratamento precoce, adotado no Brasil com cloroquina e ivermectina, foi defendido por Bolsonaro durante toda a pandemia, mas já é consenso internacional que os medicamentos não só não têm eficácia como podem ser prejudiciais aos pacientes.
O uso irrestrito de cloroquina sem o conhecimento dos pacientes tem sido, inclusive, um dos assuntos tratados na CPI.
Mentiras sobre Amazônia
"Na Amazônia, tivemos uma redução de 32% do desmatamento no mês de agosto, quando comparado a agosto do ano anterior."
Presidente Jair Bolsonaro, na ONU
Entre janeiro e agosto de 2021, o desmatamento foi de 6.026 km², de fato reduzido 32% em relação ao mesmo período no ano anterior. No entanto, o dado foi apresentado sem contexto, já que o valor é quase o dobro do registrado entre janeiro e agosto de 2018, antes do início do governo Bolsonaro, de 3.336 km².
Durante o discurso, Bolsonaro omitiu que entre agosto de 2019 e julho de 2020 a exploração de madeira na Amazônia foi quase três vezes o tamanho da cidade de São Paulo. Ao menos 11% da exploração ocorreu em áreas protegidas.
7 de setembro
Bolsonaro também mentiu ao afirmar que os atos golpistas que liderou no feriado de 7 de setembro foram a "maior manifestação" da história do Brasil. Não há dados consolidados que corroborem tal afirmação, e as informações disponíveis apontam para o contrário.
Em São Paulo, por exemplo, o ato reuniu 125 mil pessoas, segundo o governo paulista. Segundo o Datafolha, o maior ato político registrado na cidade foi o protesto pelo impeachment da então presidente Dilma Rousseff (PT), em 2016, com a presença de cerca de 500 mil pessoas.
Fonte: UOL
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