Para o professor Marcio Pochmann, do Instituto de Economia, pesquisador do Centro de Estudo de Sindicais e de Economia do Trabalho da Universidade Estadual de Campinas (Cesit-Unicamp), é correto o diagnóstico do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva de que o enfrentamento da pobreza e da desigualdade no planeta deve passar pela tributação de transações financeiras internacionais. Em entrevista a Glauco Faria, do Jornal Brasil Atual, o economista defendeu a proposta de criação de um imposto global. A medida foi apresentada por Lula, na última terça-feira (16), em palestra no Instituto de Estudos Políticas de Paris, a Sciences Po, uma das instituições mais respeitadas do mundo na área de ciência política e social.
De acordo com ele, a taxação desses fluxos ajudaria a formar um fundo de combate à miséria sobretudo nos países subdesenvolvidos. A iniciativa foi apontada pelo ex-presidente como uma “nova governança global democrática”.
“Até quando a ganância dos ricos, o isolacionismo dos governos e o individualismo vão prevalecer sobre os interesses do planeta e da humanidade?”, questionou o petista. “Estamos falando da responsabilidade dos Estados nacionais e da recuperação do papel da política, em seu mais elevado sentido, para enfrentarmos juntos e coordenadamente o desafio da desigualdade. O atraso, a pobreza e a fome não são mandamentos divinos. São o resultado do que fazemos ou deixamos de fazer neste mundo”, acrescentou.
Um debate de décadas
A sugestão de Lula retoma um debate pautado por ele 18 anos atrás, durante sua participação no Fórum Econômico Mundial em Davos, em 2003. Já à época, o então presidente do Brasil defendia a ideia partindo da criação de um fundo que viesse a financiar a atividade de combate à pobreza. A proposta levava em conta estudos da década de 1970, do economista estadunidense James Tobin, que levanta a ideia de regulação do sistema financeiro estabelecida a partir de uma tributação. A iniciativa, conhecida como “Taxa Tobin“, também era constantemente pautada em debates do Fórum Social Mundial. Os movimentos sociais defendiam que, mesmo que fosse aplicado um imposto muito baixo, a taxação acabaria freando os fluxos especulativos de curto prazo.
O tema ganhou urgência durante a crise financeira internacional em 2008, mas mesmo assim, pouco avançou. Segundo Pochmann, a resistência à proposta é semelhante às barreiras que há no Brasil para a tributação de grandes fortunas. “Tendo em vista que os ricos não estão de acordo, digamos, de compartilhar uma parte de seus ganhos com objetivo de amenizar a gravidade na qual nos encontramos”, critica o economista. Por outro lado, aponta ele, o atual contexto de crise sanitária global dá à medida um sentido de urgência.
Resultados da taxação
Pochmann também avalia que as discussões podem ser favorecidas por conta da criação de um imposto global de até 15% sobre o lucro de empresas multinacionais. A tributação foi aprovada em junho deste ano pelo G7, o grupo de países com as maiores economias do mundo e, em outubro, foi ratificada pelo G20. A estimativa é que os recursos, que devem começar a ser arrecadados em 2023, fiquem em torno de US$ 140 bilhões. O que daria ao Brasil, segundo essa estimativa, cerca de R$ 6 bilhões. A proposta de Lula, porém, dá um passo adiante, já que este seria um imposto sobre as transações internacionais, e não apenas sobre o lucro das multinacionais, neste caso, limitado às companhias com receita anual superior a € 750 mil.
“É muito importante que o presidente Lula traga novamente esta perspectiva. Os fluxos financeiros internacionais praticamente controlam a política no mundo e impõem uma diferenciação e riqueza acentuadas. Seria uma pequena contribuição, uma taxação desses fluxos que ajudariam a formar um fundo de enfrentamento da pobreza”, explica Pochmann. “A pandemia demonstrou a incapacidade dos governos de tributarem localmente.”
Fonte: Rede Brasil Atual
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